sexta-feira, 22 de agosto de 2008

História e Cultura Afro-Brasileira e Africana

HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA


Luiz Etevaldo da Silva*

A Lei Federal nº 10.639 de 2003 determina a inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos de Educação Básica. Tem como fundamento reforçar a luta pele diminuição do preconceito, discriminação e racismo com relação aos afrodescendentes no contexto social brasileiro. É um dispositivo legal importante, embora o fenômeno seja complexo, que não se resolve com simplesmente uma lei.. Pois, trata-se de mudança cultural e isso é difícil e lento para transformar, mas é possível, visto que o racismo foi criado por homens e mulheres no decorrer dos tempos. Encarar esta questão no âmbito das relações pedagógicas e políticas na escola é necessário.

A escola, enquanto instituição social responsável por assegurar o direito da educação a todo e qualquer cidadão, deverá se posicionar politicamente contra toda e qualquer forma de discriminação. A luta pela superação do racismo e da discriminação racial é, pois, tarefa de todo e qualquer educador, independente do seu pertencimento étnico-racial, crença religiosa ou posição política (CNE). Contudo, simplesmente incluir este conteúdo no currículo não significa que esteja atendendo os anseios dos que lutam pela filosofia intercultural. Uma coisa é colocar como perfunctório, ou seja, para atender as obrigações da Lei, outra é acreditar que é importante e dar visibilidade pedagógica e política no currículo, criando condições de proporcionar ampliação da democracia e da cidadania.

Pensar o preconceito, a discriminação e o racismo pressupõem-se querer um modelo de sociedade mais democrática e com mais cidadania. É explicitar no currículo a dimensão política da educação voltada a intervenção social e cultural. É criar meios para constituir subjetividades que favoreçam a criação de novas formas de sociabilidade, com mais alteridade, equidade e cidadania. A Lei 10.639, neste sentido, constituiu-se numa decisão política do Governo Federal. Encarou a questão com o mérito que merece. De acordo com o pensamento da professora Luciane R. D. Gonçalves, ao qual também concordo, “a temática racial tem muito a contribuir para a construção de um currículo e de uma escola mais democrática, que aborde as diferenças e as lutas cotidianas por uma sociedade mais justa”. Sendo assim, é preciso considerar que tratar a questão étinico-racial no currículo escolar, no caso a africana, exige também uma postura política, uma explicitação em defesa da luta pelas desigualdades sociais, de políticas públicas de qualidade, enfim, repito, por mais cidadania. Pois, os afrodescendentes é um grupo étnico em desvantagem no Brasil, devido evidentemente as formas políticas que excluíram eles no decorrer do processo histórico, desde o sistema escravista e pós-libertação. Hoje 120 anos da criação da Lei Áurea, que determinava o fim da escravidão no Brasil, ainda são visíveis a condição de exclusão social, econômica e cultural dos afros contemporâneos, todas as pesquisas mostram isso.

Segundo Gonçalves, a valorização da cultura européia fez com que as outras raças e etnias, como indígena e a africana, ficaram relegadas a inferioridade e até em certos casos no abandono total e exclusão. A aculturação de um povo é como lhe tirar sua representação e deixar-lhe sem alma. Tal fato repercute com gravidade na sua auto-estima e na sua valorização como raça. Refletindo profundamente com base em suas idéias podemos levantar como sendo uma das determinantes da violência social este problema desprezo etino-racial histórico. Visto que isto se configura nas relações humanas cotidianas, através de piadas, olhares, ironia, rejeição, generalizações, estereótipos, entre outra tantas formas de expressão.

Portanto, o tema abordado neste texto é um desafio para toda a sociedade e, principalmente, para nós educadores. Temos que confessar que é difícil trabalhar pedagogicamente a temática dos preconceitos, da discriminação e do racismo. Mas é preciso, muitas reflexões, debates, são necessários para nos preparar filosoficamente. Não existem receitas prontas para tratar este assunto com certeza. O caminho mais indicado penso ser o de criar condições de humanização, através de um currículo que tenha como fundamento a reflexão ética, disposição política para construir um modelo de sociedade mais justo e que valorize a interculturalidade, enquanto diálogo respeitoso entre as diversas culturas.

*Professor

Texto publicado no Jornal HoraH, Ijuí/RS, em 15/08/08.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

A DIMENSÃO POLÍTICA DO CONHECIMENTO

Luiz Etevaldo da Silva**
Que modelo de sociedade pretendemos? Sempre que fazemos esta pergunta estamos nos referindo à política, sem recorrer a conceitos de famosos filósofos e cientistas políticos. No ponto de vista educacional faz-se necessário pensar em primeiro lugar o que pretendemos ao educar. Que conteúdos escolares são importantes para criar condições de constituir formas de sociabilidades que valorizem a vida em primeiro lugar. Cujos sujeitos no processo social aprendam a pensar a sociedade levando em consideração as diversas dimensões que configuram as práticas sociais e políticas. Na sociedade temos correlações de forças que disputam espaço e cada uma defendendo seus interesses. Num Estado democrático é fundamental que tenhamos capacidade de dialogar, com capacidade de discernimento, para buscar entendimentos sobre o que é melhor para nós. Neste processo a educação é indispensável.
Buscar um conhecimento para uma vida decente é procurar pela própria história da educação enquanto instituição que contribui para a cristalização do modelo preconizado pela modernidade e, a partir do compromisso articulado no e com o mundo, construiremos sua superação, apontando para uma escola possível e viável para as classes populares (Costa). A relação entre educação e política é determinante para quem pensa em mudanças sociais, políticas e econômicas. Tudo tem ligação com a política. A sociedade que temos é resultado de ações articuladas por ela. Alguém em algum tempo e espaço pensou o que seria o mais adequado, de acordo com seus interesses. A história social não é algo natural, ela é construída por homens e mulheres no processo de viver em sociedade.
A sociedade precisa ser pensada e repensada. Se nós não pensarmos, alguém fará por nós. Mas, não é suficiente apenas pensá-la. È necessário consciência e depois enfrentamento para construir as formas de sociabilidades, as relações dos humanos com a natureza e com o mundo do trabalho que desejamos. Entender e compreender o processo histórico como possibilidade é condição para sermos protagonistas da história. “A possibilidade está em dizer a palavra, em desafiar os grupos populares, para que percebam, em termos críticos, a violência e a profunda injustiça que caracterizam sua situação concreta”(Freire). Política, então, é refletir para encontrar meios inteligentes e éticos para se construir relações que favoreçam a cidadania. É participar e dizer o que desejamos. A educação para politização tem compromisso com a dignidade humana, ou seja, com os direitos humanos.
O discernimento político depende da crítica para desvelar as dimensões ocultas das relações de poder do processo social. A problematização e esforço para entender as correlações de força de um determinado contexto sócio-político é fundamental para entender seu funcionamento e perceber quem é quem no processo. O Conhecimento é importante para tomar decisões. Ele diminui o âmbito das incertezas. Permite ter uma visão ampliada e dialética do processo histórico. Por isso, considero que ele é argamassa indispensável para o desenvolvimento social. “O conhecimento, como resultado de processos de aprendizagens, não existe no abstrato. Ele só existe aderido a pessoas, enquanto significado por sujeitos cognoscentes, ou reconhecido como tal. Um ato de conhecer implica, portanto, a cumplicidade do sujeito que o realiza”(Boufleuer). Todo conhecimento tem na sua constituição uma dimensão política. É resultado de intencionalidade das pessoas que criam conceitos para expressar (e defender) o que pensam e desejam.
O processo educativo tem que levar em consideração que o conhecimento é um “instrumento” e, como tal, pode ser usado para transformar ou para conservar as estruturas e os processos de uma determinada realidade sócio-histórica. Sempre que tomamos contato com um conhecimento, precisamos perguntar: quem a construiu, em que circunstâncias, o que está por trás dele, onde quem a construiu quer chegar com ele? Pensar em educação e política é tentar descortinar os interesses que estão em jogo num determinado processo histórico e colocá-los sob a luz da razão. É procurar fazer uma leitura do mundo com vistas à pretensão de decifrar a essência dos fenômenos, ir além das aparências e subverter a ordem do superficial. Somente assim, teremos condições de defender nosso processo de sociedade.
* Texto publicado no Jornal da Manhã, Ijuí, 05/6/08.
**Professor

terça-feira, 29 de abril de 2008

A Panacéia Educacional do Governo Yeda

A PANACÉIA EDUCACIONAL DO GOVERNO YEDA
(OU SERÁ QUE SOMOS TODOS BURROS?)


Em reportagem de ZERO HORA do dia 27 de abril, intitulada “Piratini prepara revolução em carreiras”, o Governo do Estado do RS, dirigido pela Srª Yeda Crusius até o ano de 2010, definitivamente mostra para que veio.
E definitivamente mostra que veio para transferir responsabilidades, confundir a opinião pública, difundir a idéia de que o servidor público de carreira é o responsável pela qualidade do serviço público do estado.
Poderíamos mudar a linha de raciocínio e concluir que na verdade nossa incapacidade racional não nos permite estabelecer a relação simples e lógica que a governadora expressa com suas idéias revolucionárias.
Então vejamos. Para a governadora o serviço público do estado e suas leis pré-históricas são responsáveis por frear a competitividade do RS. Preocupado por não conseguir estabelecer a relação, talvez por uma formação acadêmica precária em história, consultei dois amigos economistas que, para meu espanto, ficamos os três sem conseguir acompanhar tal raciocínio.
Inconformado por nossa falta de sagacidade, ainda mais pelo compromisso que temos com uma educação pública de qualidade, só podemos concluir que nosso despreparo foi culpa das instituições nas quais nos formamos e, que no final, contribuiu o “estágio de mentirinha” (me permitindo citar a sábia e filosófica declaração da secretária Mariza Abreu) que realizamos com o aval das escolas irresponsáveis nas quais estagiamos.
Do lugar de educador, com contrato temporário, a afirmativa que pode causar mais revolta é aquela que sentencia que “o principal desafio é reverter à lógica que impera no funcionalismo: a de entrar na carreira de Estado de olho na aposentadoria”. Pelo que me consta, entramos na carreira de estado de olho na sobrevivência! Mas o que me choca é que, enquanto escrevo, busco contrapor o argumento de quem recebe de salário mais de R$ 7.000 por mês, R$ 84.000 por ano e R$ 336.000 em quatro anos, enquanto que um trabalhador gaúcho, com um mínimo regional, tenha que trabalhar 65 anos sem gastar um centavo para acumular R$ 335.571,60.
De qualquer forma, deixando de lado a sátira e o espanto por tais colocações, é preciso encarar o papel do Estado e a ação de governo com a eminência de quem tem consciência dos assuntos públicos e, de preferência, com uma agenda de responsabilidade social.
Nesse sentido queremos afirmar que a política de premiação deve vir bem depois da política de dignidade salarial, que a responsabilidade pelas políticas de estado não são dos servidores públicos que têm funções estatutárias definidas e não funções de mandato; que a qualidade do serviço público é o resultado do seu investimento público e da valorização profissional e que o funcionalismo público é exercido com responsabilidade, com compromisso e permanecerá responsável e compromissado após a passagem deste governo.
Ainda assim, entendemos, trabalhadores em educação e demais servidores públicos do Estado do RS, que mais do que nunca é preciso abrir o diálogo com a sociedade gaúcha e exigir políticas públicas de impacto social que conduzam nosso estado ao crescimento, ao desenvolvimento, à melhoria da qualidade de vida de todas as pessoas. E acima de tudo, que se faça isto com respeito ao servidor público que tem no sangue a cultura da solidariedade e do compromisso gaúcho.
Paulo César Machado
Vice Diretor 34º Núcleo do
CPERS/Sindicato
Guaíba

segunda-feira, 28 de abril de 2008

O Dilema da Educação Pública

Luiz Etevaldo da Silva*

Pensar a educação é sempre necessário para quem luta pela afirmação e ampliação da democracia, da cidadania, pela justiça, ou seja, pelo desenvolvimento social. Num país como o Brasil, com imensas desigualdades sócio-econômicas, a educação pública é a única chance que dispõe a maioria da população para possibilitar à alfabetização, acessar ao conhecimento escolar, desenvolver as competências e habilidades que a sociedade contemporânea requer para dar conta das demandas do mundo do trabalho e das sociabilidades.
Nas últimas décadas, temos ouvido discursos e debates entre o Estado e a sociedade civil acerca da importância da inclusão dos excluídos sócio-economicamente na escola (pública). Isto acabou melhorando bastante. Agora a luta é pela qualidade da educação pública. Este considero um dos grandes dilemas do momento histórico que vivemos, em nível de Brasil. Visto que educação pública de qualidade supõe uma visão política que tenha como pressuposto dar oportunidades aos setores populares de igualdade de interação no mundo do trabalho, político, social, cultural, etc. “Neste momento alguém (da elite) certamente gritará, pára aí! O povão não pode colocar os privilégios da elite (econômica, social, cultural e política) em risco”. O importante, para os representantes dela, é oportunizar escola para todos. Porém, a qualidade é uma outra coisa.
Qualidade da educação pública não interessa aos que sempre tiveram e defenderam os privilégios da elite. Para manter a realidade social configurada como está os setores políticos têm claro que a desigualdade na educação remete à desigualdade social e econômica. Esta é uma das razões principais que não interessa educação pública de qualidade. A visão do capitalismo vigente controla a ascensão dos grupos populares, também, através da educação. Por isto, há aqueles que pensam e defendem que a escola pública não precisa ter supervisora, orientadora, bibliotecária, laboratórios, tecnologia. Na visão dos arautos do sistema, o povão não deve ter educação de qualidade, ele serve, principalmente, para ser objeto do sistema. Esta é a lógica entendida de forma simplificada. Para os conservadores, os setores populares não podem aprender a pensar a complexidade dos processos de dominação e a perversidade da política neoliberal.
Como os governantes são, em geral, da elite, educação pública continua décadas e décadas com índices desfavoráveis. O pior, passam para a sociedade que os principais culpados pela educação com baixa qualidade são os professores, que não são criativos. Segundo o ideário neoliberal, o sistema é uma beleza, nós é que somos incompetentes! Escondem sutilmente a lógica de exclusão do sistema vigente, que se dá, também, por meio do sistema de educação.
Quando ouvimos a educação vai mal, devemos perguntar, qual? A da elite vai bem! Pelo menos não ouvimos protestos em favor de qualidade na educação privada. Lógico que procuram qualificar mais a cada dia. Neste momento de construção de greve nas escolas públicas estaduais, em favor de educação pública de qualidade, os governantes não estão nem aí. Pois, os filhos deles certamente estão nas escolas particulares. Greve nas escolas públicas significa mais oportunidade para os filhos deles, que ganham tempo no desenvolvimento cognitivo e cultural.
O problema fundamental da educação pública ineficiente é político. São princípios e concepções que valorizam mais a lógica do mercado à lógica da vida. A luta por um modelo de sociedade em que o social esteja acima do mercado é o desafio primordial deste início de século. Pois, não há país desenvolvido sem educação de qualidade. A politização, nossa educadores e setores populares, é fundamental para mudar o curso da história, sobretudo no RS, pois é aqui que vivemos momentos difíceis, por causa da investida neoliberal. A nossa mobilização é que pode impedir o desmantelamento do sistema público de ensino. “Avante educadores, pais e alunos das escolas públicas”!

*Professor(Ijuí/RS)- email: luizetevaldo@yahoo.com.br

quarta-feira, 19 de março de 2008

PAGAMENTO DA LEI DE POLÍTICA SALARIAL "LEI BRITTO"

Orientação do Jurídico do Cpers Sindicato acerca da proposta do Governo Yeda em pagar escalonadamente as pendências da Lei Britto. Como é de utilidade pública, tornamos acessível a todos que queiram maiores esclarecimentos




TENÇÃO ASSOCIADOS DO CPERS!

NINGUÉM DEVE DESISTIR DOS PROCESSOS JUDICIAIS DA POLÍTICA SALARIAL

INFORMAÇÃO DA ASSESSORIA JURÍDICA SOBRE O PROJETO DE LEI Nº 54/2008, QUE TRATA DO PAGAMENTO DOS REAJUSTES DE VENCIMENTOS PREVISTOS PELAS LEIS Nº 10.395/95 E 10.420/95 (Política Salarial Governo Britto)


No dia 18 de março de 2008 a Governadora do Estado enviou à Assembléia Legislativa Projeto de Lei que “ autoriza o Poder Executivo a implantar índices de aumento previstos nas Leis nºs 10.395/95 e 10.420/95.”.

O Projeto tem apenas três artigos, nos quais consta a autorização para cumprimento do disposto nas citadas Leis, no que concerne aos índices fixos de reajuste, em quatro parcelas, de acordo o estabelecido no Anexo Único, que faz parte integrante do texto.

O Anexo Único indica os Quadros beneficiados pelas Leis que concederam os reajustes, prevendo o pagamento de ¼ do percentual correspondente em agosto de 2008, ¼ em março de 2009, ¼ em agosto de 2009 e, por fim, ¼ em março ou agosto de 2010. Conforme o previsto os índices pagos em cada parcela não serão cumulativos, interando, ao final, os percentuais totais devidos em função do disposto nas Leis nº 10.395/95 e 10.420/95.

O Projeto não trata de pagamento de atrasados e excetua aqueles que já tenham obtido em Juízo os mesmos índices.

Portanto, beneficia os que não ingressaram na Justiça, os que ingressaram na Justiça e que ainda não obtiveram a implantação por ordem Judicial e os que, tendo ingressado, perderam os processos.

Surgem daí indagações de como ficam algumas situações não contempladas ou previstas pelo Projeto.

Serão pagos os atrasados?
O Projeto não tem previsão em relação ao pagamento e os próprios representantes do Governo estão dizendo pela imprensa que serão satisfeitos através de Precatórios. Tal informação indica que a única forma de obter os atrasados será através do ajuizamento de ações judiciais. Assim, quem tem ação em Juízo não deve desistir da mesma e quem não tem deve ajuizar para cobrar os atrasados.


Como fica a situação de quem tem processo em Juízo e ainda não teve os reajustes implantados?
O Projeto diz que os reajustes serão escalonados ao longo dos próximos três anos. Assim, no decorrer desse período quem obtiver ordem judicial de implantação terá o direito de perceber todo o reajuste de imediato. Portanto, não deve desistir do processo, até porque, se alguma das parcelas previstas no Projeto for implantada antes da ordem judicial será apenas compensada do valor total final.

Como fica a situação dos atrasados de quem perdeu na Justiça?
Essa situação terá de ser novamente pensada e formulada como ação para ser discutida em Juízo, pois o Projeto representa um reconhecimento do direito, o que poderá gerar um novo pedido de atrasados, com base nessa norma. Essa questão, entretanto, é complexa e exigirá um adequado estudo jurídico sobre viabilidade de uma postulação desse tipo.

Havendo o reconhecimento do débito em relação a todo o débito previsto nas Leis nº 10.395/95 e 10.420/95, como fica a totalidade dos créditos deles decorrentes durante o período compreendido entre agosto de 2008 e março ou agosto de 2010?
O inciso XXXVI, do artigo 5º, da Constituição Federal, diz que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Assim, havendo direito adquirido dos servidores beneficiados com os reajustes previstos nas Leis nº 10.395/95 e 10.420/95 qualquer disposição de lei que restrinja sua eficácia infringirá a norma constitucional antes citada. Portanto, não são inconstitucionais as disposições do Projeto Lei nº 54//2008, mas o calendário de pagamento proposto deixa cumprir por inteiro os direitos previstos nas referidas Leis que pretende cumprir, deixando para trás não só os atrasados que retroagirão a agosto de 2008, como, também, as diferenças entre a primeira parcela e o total devido, que será integralizado em março ou agosto de 2010. Essas diferenças poderão, também ser cobradas em Juízo.

Reiteramos, desta forma, que ninguém deve desistir dos processos judiciais, pois o que vai ser concedido pelo PL 54/2008 é apenas o reconhecimento de parte do que a Justiça já está dando, havendo o direito aos atrasados, sobre os quais não há porque renunciar.

Essas são as primeiras observações que podem ser feitas sobre o Projeto, devendo-se aguardar a tramitação do mesmo, as emendas que receberá na Assembléia e a sua transformação em Lei, que só ocorrerá com a sanção da Governadora, para se ter uma posição jurídica definitiva sobre os efeitos e conseqüências do mesmo sobre os diretos dos servidores beneficiados.

Porto Alegre, 19 de março de 2008.


Buchabqui e Pinheiro Machado
Advogados Associados

sexta-feira, 14 de março de 2008

EDUCAÇÃO E CIDADANIA

Luiz Etevaldo da Silva[1]


RESUMO

O artigo tece considerações acerca das dimensões da cidadania no processo educativo. Partimos de reflexões sobre o sentido e o significado dela na prática pedagógica. Depois analisaremos as possibilidades de ampliação pelas políticas públicas, o papel da escola voltada à educação cidadã, os desafios de uma prática constituinte da cidadania e a performance pedagógica e epistemológica que pode dar fundamentação a dialética educativa empoderadora dos sujeitos para conquista da cidadania.

Palavras-chave: cidadania- poder público- educação cidadã

ABSTRACT

The article talks about the dimension of citizenship in the educative process. We start by reflecting about the sense and the meaning of this citizenship in the pedagogical practice. Then, we are going to analyze the possibilities of enlargement through the public politics, the role of school according to the citizen education, challenges of a pedagogical practice related to the citizenship and the pedagogical and epistemological performance which can give sense to the educative dialectic that gives resources to people have the citizenship.

Word-key: citizenship - to can public - education citizen


INTRODUÇÃO

Todo processo educativo deveria ter como pressuposto facilitar a ampliação da cidadania. O conhecimento e os saberes precisam ter uma relação significativa com a vida dos sujeitos educandos. Educação que não contribua para uma melhor qualidade de vida tende a perder o sentido. Educação para o exercício da cidadania exige pensar a vida em sociedade e refletir sobre o mundo. Sendo assim, não há um modelo de aula de cidadania, tudo depende do contexto de sala de aula, do espaço onde se fala, da realidade social e política dos educandos. Os conteúdos voltados à educação cidadã tem que abranger as diversas dimensões epistemológicas, ou seja, o conceitual, procedimental e o atitudinal. O sujeito precisa ser visto numa multiplicidade de relações e todas interligadas, formando uma rede de relações. É necessário pensar que a cidadania é uma construção social e política, que envolve relações de poderes.

DIMENSÕES POLÍTICA E CONCEITUAL DA CIDADANIA

A educação para ser coadjuvante da cidadania não pode ser desligada da dimensão política. Visto que as relações sociais são marcadas por interesses, concepções e princípios. Conseguir cidadania no seu sentido amplo, então, é algo que envolve embate entre os seres sociais. A qualidade de vida está relacionada a uma dimensão coletiva, pois acontece em espaço social, onde muitas vezes alguém precisa abrir mão de determinados privilégios, repartir bens materiais ou imateriais, portanto, mexe com o status quo. A vida em sociedade não é natural, é uma construção cultural. E ela se configura a partir de processos políticos, na luta cotidiana pelos direitos humanos, nos consensos e nos discensos, pela unidade e pelas contrariedades, na ordem e nas desordens. A cidadania necessita uma dinâmica de vida dialética.
A educação voltada à cidadania pressupõe ter como objetivo básico constituir através das práticas pedagógicas subjetividades inteligentes, capaz de reunir recursos para resolver situações complexas do cotidiano. Desenvolver um pensamento que possibilite interagir nos espaços sociais demarcadores de sociabilidade de forma crítica. Pois, a cidadania depende de participação, democracia e ética. E para isso é imprescindível um aprendizado. Conseguiremos participar com qualidade política nos destinos da vida em sociedade se tivermos conhecimentos suficientes para compreender as idéias e os interesses que dão estrutura aos debates da organização social. Entenderemos os outros como sujeitos de direitos por meio de um entendimento do que seja democracia. E nossa conduta será humanizante se tivermos noção do conceito de ética.
Mas, o que é realmente cidadania? Para o dicionário Aurélio (1986), cidadania é a qualidade ou estado de cidadão, sendo que cidadão é o indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um estado. Mas, no sentido sociológico ou filosófico o conceito engloba mais dimensões. Segundo Milan (1996), citado por Rodrigues (2001, p. 165) cidadão significa:

...possuir direitos e deveres, ou mais precisamente, exercitar-se em seus direitos civis, sociais e políticos. Por conseguinte, é cidadão todo aquele que se capacitou a participar da vida na cidade e também da vida em sociedade, obedecendo a uma ética,na convivência entre seus pares e experimentando reconhecimento e a dignidade, no exercício de uma prática política consciente.

Para Silva (1987), cidadania

Não indica somente a qualidade daquele que habita a cidade, mas mostra a efetividade dessa residência, o direito político que lhe é conferido, para que possa participar da vida política do país em que reside (...) A cidadania é expressão que indica a qualidade da pessoa, que estando na posse de plena capacidade civil, também se encontra investida no uso e gozo de seus direitos políticos, que indicam, pois, o gozo dessa cidadania (RODRIGUES, 2001, p. 166).

Existem muitos conceitos para cidadania. Tomaremos neste artigo basicamente as dimensões elencadas por Rodrigues (2001, p. 169):

· Dimensões civis: liberdade de ir e vir; liberdade de expressão; liberdade de associação; liberdade de consciência e crença; liberdade de propriedade; garantia da igualdade de direitos; garantia de não-discriminação em virtude de sexo e raça; garantia da intimidade; garantia da integridade física e moral.
· Dimensões políticas: acesso ao exercício do poder; direito de participação na elaboração das leis; acesso à imprensa.
· Dimensões sociais: prevalência do coletivo sobre o individual; garantia de acesso a saúde; garantia de emprego; garantia de moradias digna; garantia de acesso à educação.

A partir destes indicativos podemos pensar que cidadania envolve a vida social em todos seus aspectos. A sociedade historicamente constituída é resultado da busca de homens e mulheres por qualidade de vida digna. Refletir sobre a cidadania é atribuir sentido e significado ao processo de viver. É definir um entendimento da condição humana no espaço e no tempo. Racionalmente procurar uma compreensão das relações entre os sujeitos sociais e entre eles e a natureza. Sendo assim, nossa capacidade de entendimento do mundo contribui ou não para uma consciência cidadã.


CIDADANIA NA AGENDA SOCIAL E POLÍTICA

A cidadania envolve as dimensões políticas, sociais culturais e econômicas. Tem um conjunto de fatores que permite ampliá-la ou não. Entre eles está o poder público, sejam o Município, a unidade federativa ou a União. Porém, geralmente na agenda dos governos a cidadania enfatiza apenas os aspectos civis e políticos, pois, tratar da dimensão social dela mexe com os interesses dos mais privilegiados, com a questão de classe, com o modelo de sociedade vigente. É muito mais fácil um governo falar em democracia , participação, exercício do voto, etc., em vez de tratar das injustiças sociais. Um modelo de sociedade que é marcado pela concentração de renda e riqueza, nega a cidadania a maioria da população. Um poder público que não atende a contento as populações periféricas, por exemplo, marca a realidade excluidora, que marginaliza grande contingente social.
Como foi referido antes, o poder público, geralmente, enfatiza as dimensões civis e políticas da cidadania, pois a dimensão social relaciona-se com as estruturas e os processos do modelo de sócio-econômico vigente no Brasil. Expandir ela impera uma política que promova distribuição de renda. É comum as lideranças políticas tradicionais associar a cidadania simplificadamente ao ato de votar e ser votado, a distribuição de cesta de Natal, às campanhas do agasalho, à retirada de documentos,aos mutirões de corte de cabelos, medir a pressão sanguínea,pintar unhas, casamentos coletivos, etc. Contudo,sempre procurando manter inalterado o modelo de desenvolvimento negador de cidadania, no ponto de vista social.
A ampliação da cidadania pelo viés social implica políticas públicas que criem oportunidades de inclusão, investimentos em educação, saúde, infraestrutura urbana e rural, distribuição de renda, lazer, moradia digna, etc. E isso, é praticamente impossível acontecer sem participação política da parte populacional menos favorecida. É necessário os segmentos excluídos constituírem consciência que a realidade configurada é resultado de processos sociais, ou seja , criada culturalmente pelas elites , não é algo natural. Sendo assim,é possível ser transformada.
Para que os poderes públicos coloquem na agenda benefícios aos mais necessitados é necessário pressão política, sem isso, não teremos ampliada a cidadania. É imprescindível participação política, os grupos privilegiados, em geral, não dão dádivas aos excluídos. É necessário que eles se assumam como sujeitos capaz de transformar. Para isso, a escola é fundamental, como defende Paulo Freire (1999, p.46):

Uma das tarefas mais importantes da prática educativa crítica é propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de raiva porque é capaz de amar. Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto.

A ESCOLA EDUCANDO PARA A CIDADANIA

Um dos compromissos da escola pública, principalmente, é construir conhecimentos e saberes que ajudem os educandos na luta por melhores condições de vida. Para isso é importante não esquecer de explicitar a dimensão política do processo educativo é necessário educar para empoderar os sujeitos na participação social e política. A prática pedagógica precisa estar voltada à emancipação e libertação. Não esquecer que

Cidadania não é algo abstrato; faz parte da realidade do indivíduo, do direito à convivência, ao respeito mútuo, à segurança, à solidariedade,à amizade,à proteção e à liberdade. É ter consciência dos direitos, deveres e lutar para que se transformarem em realidade (SILVEIRA, 2001, p.12).

A libertação do educando da ignorância, dos preconceitos, da discriminação, dos estereótipos resulta na formação de subjetividades com mais possibilidades de emancipar-se, com consciência do seu papel no processo histórico. A educação precisa se articular para ser coadjuvante do protagonismo sócio-histórico das camadas populares.Para isso, tem que seguir a lógica da justiça curricular (CONNEL, 1995), cujo processo epistemológico não se desenvolve pela visão das camadas dominantes. Articula-se a partir dos interesses dos sujeitos excluídos, filosoficamente voltada a torná-los sujeitos da história, não adotando a mesma lógica que configurou o quadro social marcado pela injustiça social.
A escola pode ajudar a formar sujeitos críticos, que saibam julgar, fazer escolhas com menos contingências, emancipar-se da tutela dos grupos privilegiados, aqueles que tem como hábito considerá-los como objetos manipuláveis, principalmente em épocas de eleições, quando precisam do voto para manterem-se no poder político.
Até porque, como afirma Freire (1991, p. 83):

A escola onde tem lugar de destaque a apreensão crítica do conhecimento significativo através da relação dialógica, é a escola que estimula o aluno a perguntar, a criticar, a criar, onde se propõe a construção do conhecimento coletivo, articulando o saber popular e o saber crítico, científico, mediado pelas experiências do mundo.

Assim, é necessário um projeto pedagógico que ajude as camadas populares a engajarem-se na organização do espaço em que vivem, lutar pelos direitos humanos, por voz e vez no processo sócio-político. A politização dos seres sociais é fundante de uma sociedade esclarecida, que sabe o que quer, não ficar dependente que outros venham de fora dizer o que é bom para eles.
O educador para uma educação cidadã precisa acreditar na inclusão social, ter uma perspectiva política libertadora, ter uma prática coerente com a teoria e vice versa. Ter consciência que a história é construída por homens e mulheres mediante a participação política. Terá que buscar informações além da mídia burguesa. Ir em busca de visões de mundo alternativa, que enfatize uma lógica a favor da vida com qualidade. A educação crítica precisa de argumentação para o diálogo, saber defender seus interesses. Como pensa Demo(2000, p. 40):

Argumentar torna-se arte porque implica a construção jeitosa do discurso que, consciente de seus limites, busca convencer pela fundamentação aberta (...) Tentamos cercar a realidade que sempre é maior que nossa capacidade de argumentar. Precisamos de outros pontos de vista para vermos melhor, já que sozinhos, não ultrapassamos nossa maneira de ver.

UMA PRÁXIS CONSTITUINTE DA CIDADANIA

Uma educação que seja coadjuvante da cidadania impera para direcionamento político-pedagógico libertador. No século XXI temos que ter clara a perspectiva filosófica e sociológica que vai orientar nossa prática, como afirma Freitas (2007, p.8):

A reflexão em torno da educação e seus desafios no século XXI vem se constituindo em tema recorrente. A necessidade de atualização dos compromissos a serem assumidos pelas práticas educativa em cada momento histórico mobiliza-se frente à consciência da aceleração das transformações sociais neste início de século e de milênio. Diante das alterações que se anunciam no cenário social, a reflexão-ação em torno das mudanças no âmbito da escola e da educação em geral emergem como desafios nos educadores e às políticas educacionais. A necessidade de mudança assume caráter inquestionável no âmbito dos mais variados discursos e a urgência da educação do século XXI se traduz pela prerrogativa da inovação como sinônimo de transformação.

A educação na escola pública, sobretudo, precisa estar em sintonia com as idéias transformadoras que estão sendo gestadas nos movimentos populares. Pois, ampliar a cidadania, no caso brasileiro pressupõe transformações sociais, políticas e econômicas. Visto que ela ficará apenas no discurso se não lutarmos para que se efetive políticas públicas de qualidade no campo da saúde, educação, moradia, emprego, saneamento básico, etc. É Indispensável que os conhecimentos e saberes construídos pela escola impulsione o comprometimento dos sujeitos em desvantagem a lutar para propiciar uma realidade diferente, com menos exclusão, de tal modo que

A conscientização, compreendida como processo de critização das relações homem-mundo, é condição para a assunção do comprometimento humano frente ao contexto histórico-social (FREITAS, 2007, p.11).

A educação que ajude a cidadania interpela para uma prática humanizadora, onde o ser social seja concebido como sujeito de direitos, não seja visto apenas com um simples consumidor, que serve somente para o mercado. Ela deve empoderar as pessoas desumanizadas a lutar para superação tal situação. Para isso, o processo de conscientização é fundamental, porque sem ele dificilmente acontecerá mudanças nas estruturas e processos sociais e políticos negadores de cidadania. Compreendendo que

Somente um ser é capaz de sair de seu contexto, de distanciar-se dele para ficar com ele ; capaz de admirá-lo para, objetivando-o, transformá-lo e, transformando-o, saber-se transformando pela própria criação; um ser que é e está sendo no tempo que é o seu, um ser histórico, somente este é capaz, por tudo isso, de comprometer-se (FREIRE, 1979, p. 17).

A nossa perspectiva pedagógica é que vai alicerçar nosso projeto de educação cidadã. Educadores(as) com idéias conservadoras pouco vão ajudar aos educandos no processo de transformações sociais. A visão pedagógica dos docentes é fundante ou não de um processo de luta por cidadania. Freire (1986, p.27) argumenta que

Um dos papéis políticos fundamentais do educador é contribuir com a força da especificidade de uma situação pedagógica para transformar a escola conforme os interesses, as necessidades e os valores dos indivíduos, dos grupos e das classes que fazem a escola.

A escola cidadã organiza-se com pressupostos de construir conhecimentos que sejam importantes para orientar a vida dos educandos no mundo da vida. Ele não deve ser apenas transferência de conteúdos. É necessário que os sujeitos aprendam a pensar, apropriar-se de princípios e concepções libertadores, consiga estabelecer relações entre os elementos constituintes da realidade e criem sentido e significado dos conhecimentos para a vida. Quanto a isso freire (1986, p.45) condena os educadores repassadores de conteúdos:

O ato de conhecer do conhecimento existente a uma mera transferência do conhecimento. E o professor se torna o especialista em transferir conhecimento.

A alfabetização política dos sujeitos aprendentes exige apropriação de conteúdos críticos, dimensionados politicamente, dar condições de qualidade para interagir nos espaços sociais demarcadores de cidadania. Nesse caso, precisamos aprender a dialogar para dizer o que queremos, discutir, discordar, denunciar as injustiças sociais. Costa (2007, p. 46) neste sentido diz:

E o diálogo só tem sentido na medida em que permite o exercício do agir comunicativo de que trata Habermas e que colocam os sujeitos numa relação de horizontalidade. O diálogo, por conseguinte, constitui num fenômeno humano, uma exigência existencial.

Educação para a cidadania pressupõe propiciar aprender a pensar, utilizar-se dos conteúdos como meio para articular as idéias, defender a lógica de sociedade que proporcione melhores condições de vida. E isto tem sido,segundo Costa (2007, p.47) o maior medo dos educadores. Lendo suas próprias palavras talvez nos ajude a entender melhor esta questão:

Articular o pensar tem sido, ao que nos pareceu,o maior medo dos professores, a dificuldade de colocarem em prática aquilo que defendem no plano ideacional,ou seja, uma educação que contribua para a democratização das relações, que estimule a participação, que seja veículo de exercício de cidadania,que seja, enfim, desveladora, problematizadora, um ato crítico de conhecimento, de leitura da realidade, uma experiência de libertação humana.

Não podemos ingenuamente pensar que a escola sozinha irá resolver o problema da negação da cidadania, mas acreditamos, como Paulo Freire, que ela é importantíssima neste processo. Para isso, educadores(as) e educandos(as) precisam buscarem um conhecimento capaz de romper a lógica da simplificação e aprender a lidar epistemologicamente coma complexidade. Necessitamos, então, estudar bastante, estar sempre procurando novas maneiras de ver o mundo, novas concepções, aprofundando a compreensão e qualificando a interpretação do mundo da vida. Pensando que

Assim, não é possível um ensino de qualidade se não estiver sustentado num saber estudar por parte de educandos e educadores, um estudar sério e crítico que não se limite ao mais fácil e ao mais simples, que se contente com a pura transmissão de informações, muitas vezes parciais/truncadas/desconexas/ superficiais sobre o que está sendo objeto de investigação (GARCIA, 2007, p. 57)

O ato de estudar e aprender nos completa diariamente, nos humaniza, e na escola podemos encontrar condições privilegiadas para nos constituir como sujeitos histórico-culturais. Pois,

A escola onde tem lugar de destaque a apreensão crítica do conhecimento significativo através da relação dialógica. É a escola que estimula o aluno a perguntar, a criticar, a criar, onde se põe a construção do conhecimento coletivo, articulando o saber popular e o saber crítico, científico, mediador pelas as experiências do mundo (FREIRE, 1991, p. 83).

Então, a busca da cidadania também depende da aprendizagem significativa, para isso é importante o conhecimento de nossas possibilidades e limites, saber reunir recursos para resolver situações complexas colocadas pelas circunstâncias do nosso tempo. Porquanto, “a competência, enquanto capacidade de mobilizar recursos para desenvolver a atividade, está vinculada à própria formação humana” (VASCONCELOS, 2007, p. 67).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CONNEL, R.W. Reestruturação curricular: teoria e prática no cotidiano da escola. SILVA, Luiz Heron da; AZEVEDO, José Clóvis de (orgs). Petrópolis/RS: Vozes, 1995.

COSTA, Célia Maria. Professor: história de medos e ousadias. Revista de Educação AEC. Revista de Educação AEC, Ano 36, n. 143, Brasília, abril/junho, 2007, p. 38-53.

DEMO, Pedro. Saber pensar. São Paulo: Instituto Paulo Freire, 2000.

FREIRE, Paulo . A educação na cidade. São Paulo: Cortez, 1991.

FREIRE, Paulo . Educação e mudança. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 10. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

FREIRE, Paulo; SHOR, Ira. Medo e ousadia. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1986.

FREITAS, Ana Lúcia Souza de. A urgência da uma práxis transformadora e viável na educação do século XXI. Revista de Educação AEC, Ano 36, n. 143, Brasília, abril/junho, 2007, p. 7-20.

GARCIA, Olgair Gomes. Tempos de tanto desencanto, são tempos de pensar a recriação da escola. Revista de Educação AEC, Ano 36, n. 143, Brasília, abril/junho, 2007, p. 54-65.

RODRIGUES, Marcos T. G. A importância da cidadania na educação. Revista Ciências da Educação, Ano 3, n. 5, Lorena: SP, p. 165-184.

SILVEIRA, Nádia Dumara Ruiz. Escola, comunidade e cidadania. Revista de educação AEC. Brasília, ano 3, n. 119, 2001, p. 9-15.

VASCONCELOS, Celso dos Santos. Competência docente na perspectiva de Paulo Freire. Revista de Educação AEC, Ano 36, n. 143, Brasília, abril/junho, p. 66-78.


[1] Especialista em Humanidades. Professor da rede de ensino básica do Estado do RS.

quinta-feira, 6 de março de 2008

Reforma tributária e luta de classes

Diante do rombo de R$ 40 bilhões da CPMF e do temor da recessão nos EUA, o debate sobre a reforma tributária volta a ganhar espaço na mídia. O governo Lula promete enviar uma proposta ao parlamento e trata o tema como algo puramente técnico. Já os mesmos ricaços, sonegadores, tucanos e demos, culpados pelo fim a CPMF, aproveitam o clima de incertezas na economia para exigir menos impostos. Hipócritas, eles alegam que a tributação no país é uma das mais altas do mundo e pregam cortes na “gastança social”. Neoliberais, desatam uma nova onda conservadora em defesa do “estado mínimo”, embalada numa bandeira que desperta simpatias na sociedade. O tema da reforma tributária é explosivo. O jogo de interesses que envolve é poderoso. Em certo sentido, a questão tributária é estratégica, já que condensa as contradições de classe na sociedade capitalista. A tributação reflete quem perde e quem ganha neste sistema. Quem banca a máquina pública, quem abocanha os recursos arrecadados, quem sonega e dribla o fisco. Devido às graves distorções deste sistema no país, que ajudam a explicar porque o Brasil ostenta um dos piores índices de desigualdade social no mundo, a reforma tributária é realmente uma forte exigência da atualidade, mas num sentido totalmente inverso ao pregado pelos neoliberais de plantão. “Vai resmungar na... Europa” Como revela excelente reportagem de Márcia Pinheiro na Carta Capital, intitulada “Leão atiça a desigualdade”, o sistema tributário brasileiro é dos mais injustos do planeta. “O assustador é que 70% dos impostos incidem sobre o consumo e apenas 30% sobre o patrimônio. Nos países desenvolvidos, a relação é oposta: 60% sobre o patrimônio e 40% sobre o consumo... Estudo do Unafisco [Sindicato dos Auditores Fiscais] comprova como a carga tributária é perversa. Quem ganha até dois salários mínimos gasta 45,8% da renda no pagamento de impostos indiretos, enquanto o peso para famílias com renda superior a 30 salários mínimos corresponde a 16,4%”. Quanto à suposta fúria do Leão sobre a renda dos ricos empresários e da alta classe mérdia, seria educativo se os adeptos do “Cansei” fossem morar na Europa ou mesmo nos EUA para deixarem de reclamar. O artigo desmonta este outro mito da mídia manipuladora. “A alíquota para pessoas físicas, aqui, vai de zero a 27,5%. Na Argentina, de 9% a 35%. Nos Estados Unidos, de zero a 35%, fora os impostos estaduais. Na França, varia de 5,5% a 40%... O imposto nativo sobre a renda tem baixa participação no total das receitas tributárias de apenas 6,6% do PIB, enquanto a média dos países europeus é de 13,6%. Além disso, no Brasil há apenas duas alíquotas, de 15% e 27,5%, enquanto nos EUA existem cinco categorias, o que torna o imposto mais justo”. A manipulação dos números Para a especialista Leda Paulani, professora de economia da USP, o sistema tributário brasileiro é injusto porque é regressivo – quem ganha menos paga mais impostos e o setor produtivo é mais penalizado do que os que lucram com a especulação financeira. Para ela, seria necessário reduzir as contribuições que incidem sobre o consumo, que atingem toda a população, e compensar esta perda com o aumento dos tributos diretos sobre a riqueza e a renda. Mas esta briga é titânica e a correlação de forças é adversa no parlamento. “A discussão sobre o patrimônio é a primeira a ser derrubada no plenário em qualquer tentativa de levar adiante a reforma tributária”, contesta. Quanto ao volume arrecadado, também há muita manipulação. De janeiro a outubro, a Receita arrecadou R$ 484 bilhões – 14% a mais do que no mesmo período de 2006. Parte deste aumento decorreu do próprio crescimento econômico de 5,2% nos três primeiros trimestres. Outra parte derivou da maior eficiência da fiscalização sobre os sonegadores. Além disso, como alerta Amir Khair, ex-secretário de Finanças da capital paulista, outra fatia enriquece os rentistas por meio de juros que remuneram títulos da dívida pública. “Da carga tributária de 34,2%, em 2006, foram abatidos 6,8% em juros. O que a União teve em caixa, na verdade, foi 27,4% do PIB para custeio e investimento. E não os alardeados 40% sempre sacados da cartola dos que reclamam da carga”. As benesses para os ricaços Na prática, o trabalhador é quem paga mais impostos no Brasil, já que o tributo é descontado na folha de pagamento. O chamado setor produtivo também sofre em decorrência do efeito cascata dos tributos. Já os tubarões contribuem bem menos proporcionalmente, quando não sonegam ou driblam o fisco através das isenções e elisões fiscais (brechas na legislação) e da informalidade. Parte destes bilhões não arrecadados é desviada para os paraísos fiscais no exterior. No caso da economia informal, Pedro Tolentino, presidente da Unafisco, afirma que é impossível mensurar o desfalque, “mas há cálculos de que, para cada um real pago à Receita, um real é sonegado”. A revista Carta Capital ainda registra outras três benesses concedidas aos ricaços. Até hoje não foi regulamentado o Imposto sobre Grandes Fortunas, apesar de ser contemplado na Constituição de 1988. Já os latifundiários e barões do agronegócio são beneficiados pelas medíocres alíquotas do Imposto Territorial Rural (ITR), além de contarem com a precária estrutura de fiscalização no campo. “Por fim, os grandes sonegadores abrigam-se no Judiciário, diz Khair. ‘Uma execução fiscal leva anos e anos para ser resolvida’. Não raro, quando a decisão sai, o devedor já fechou as portas, mudou a razão social ou lançou mão de outra manobra para não quitar os débitos”. De todos os setores da burguesia beneficiados pelo injusto sistema tributário o que menos pode reclamar é o capital financeiro. Principalmente a partir do reinado de FHC, em 1995, a legislação privilegiou banqueiros e rentistas. “A remuneração dos juros de capital próprio permitiu que os cinco maiores bancos do sistema financeiro nacional tivessem uma redução nas despesas com encargos tributários no montante de R$ 2,1 bilhões em 2005. Isso num ano em que lucro líquido das instituições registrou expressivo crescimento de 49,9%, para R$ 18,8 bilhões. Fora que os investidores estrangeiros são isentos de impostos quando adquirem títulos da dívida pública”. * Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi, 2ª edição)

O DISCURSO DA TÉCNICA OU A FALÁCIA DA NEUTRALIDADE

“Daí o tom de raiva, legítima raiva, que envolve o meu discurso quando me refiro às injustiças a que são submetidos os esfarrapados do mundo. Daí o meu nenhum interesse de, não importa que ordem, assumir um ar de observador imparcial, objetivo,seguro dos fatos e dos acontecimentos. Em tempo algum pude ser um observador ‘acizentadamente’ imparcial, o que, porém, jamais me afastou de uma posição rigorosamente ética (Paulo Freire).”
A pós-modernidade tem se deparado com um tipo de discurso (reativo) se legitimando ou buscando construir legitimidade principalmente a partir da década de 1990. Esse discurso ou vinha no corpo mesmo ou na esteira de uma outra concepção que afirmava o fim da história ou o fim das ideologias.
Credenciado a partir do fim da União Soviética (URSS) e das esperanças (?) de um socialismo centrado na garantia do inalienável direito à felicidade humana _ em oposição ao socialismo real _ estava naturalmente determinado a conduzir, em uma visão rasa de determinismo linear, o ser humano, até que enfim, ao progresso e à felicidade.
No tocante às relações internacionais as nações atrasadas deveriam apenas seguir o exemplo e o modelo, agora, redentoramente ofertado pela cartilha infalível dos países ricos. O resto era questão de tempo e o mundo, segundo esse discurso, estava pronto para ser feliz e usufruir as conquistas tecnológicas do capitalismo humanizado.
Essa visão de mundo, que como discurso se manifesta em um conjunto de práticas e ações que vão de noticiários comprometidos com a “veracidade dos fatos” às falas de personagens televisivos e cinematográficos construiu, ao longo de sua experiência em formatar e normatizar nossa opinião, uma série de desdobramentos ou de discursos transversais que cumprem o mesmo destino: fazer-nos acreditar que existe uma forma apenas e apenas uma forma de ver o mundo, porque esta é a forma ou a maneira certa, incontestável e inconfundível.
Este paradigma, este discurso expressão do pensamento único e da naturalização de quase todas as situações sociais _ que seria um equivalente ou desdobramento dos fenômenos naturais e não-humanos _ foi, em toda sua potência, o genitor do discurso da técnica, investido da falácia da neutralidade.
Hoje, nestes tempos de modernidade tardia, é essa a derradeira carta na manga do pensamento único, da versão transformada em realidade, da opinião transformada em verdade e de uma forma de verdade transformada em fato. É este o papel do discurso da técnica: colocar um ponto final na discussão social, política, cultural, econômica e humana. Há um jeito de se fazer às coisas e um jeito apenas, em que a condução técnica da “coisa” – principalmente da coisa pública _ tem caráter de neutralidade.
Ser técnico, analisar tecnicamente é ser neutro e ponto final. É ser responsável com a “natureza das coisas”. Coisas que, naturalmente, têm cada uma o seu lugar, cada uma sua evolução.
Pois é esse discurso da neutralidade técnica travestida de eficácia para o bem comum, imparcial e infalível, que conduz nossa compreensão social pelos caminhos da superficialidade.
Para além das disputas teóricas iluministas e pós-iluministas, deve-se centrar toda a força da racionalidade histórica em sua percepção. Pois é tarefa de todas as pessoas preocupadas em tornar o bem-comum um lugar de justiça e de garantia do inalienável direito à felicidade humana.
Não é possível aceitarmos que o velho capitalismo (em que tudo o que se produz destina-se às relações de mercado, que não tem por princípio atender às necessidades humanas) utilize-se, incontestavelmente, de um discurso que tem como principal tarefa nos deixar calados e estáticos.
Calados, para um falso mundo técnico e imparcial, a-histórico, que naturaliza a pobreza, a desgraça humana, a violência, a dor, a infelicidade.
Estáticos, para um mundo que, vale dizer, assisti a derrota das ideologias pela ideologia da neutralidade técnica.
Paulo César Machado
Profº de História

A destruição da educação pelo Governo Yeda

Com a suposta intenção de sanear a máquina pública do Estado, cortando recursos, o Governo Yeda, na pessoa da Secretária de Educação, Mariza Abreu, tem reduzido o número de turmas e fechado escolas. Porém, é preciso compreender, que por trás deste suposto saneamento de contas, encontra-se o real interesse de sucatear e, até mesmo, destruir a educação pública no Estado do Rio Grande do Sul.
O inchaço das salas de aula causado pelo fechamento de cerca de 2000 turmas e de 105 escolas em todo estado acarretará na queda sensível de qualidade na educação pública estadual. Não precisa nem ser especialista no assunto para entender e concluir isto. Uma sala de aula lotada faz com que o educador não possa atender de maneira satisfatória a todos os alunos. Imagine uma aula de Língua Portuguesa, uma das disciplinas que leciono, ou de Matemática, entre outras matérias escolares, que exigem, freqüentemente, atendimento individual aos alunos em uma sala de aula com 45 estudantes. Será possível, nestas condições, que o professor atenda de maneira satisfatória a todos os alunos? Quem responder que sim que me ensine a mágica ou que passe a pensar racionalmente.
O Estado mínimo neoliberal superlota salas de aula sem dar condições de trabalho dignas aos professores e sem fornecer os recursos para uma educação de qualidade. Para exemplificar, no ano que passou, o Instituto Olívia, que responde por um curso de formação de professores (Curso Normal), ficou a totalidade do ano letivo com a biblioteca fechada, pois o governo de Estado não designou ninguém para atender neste indispensável setor escolar.
Já no ano passado pronunciei-me, no jornal Panorama, de Taquara, sobre a maneira de condução das políticas públicas no Governo Yeda, o que afetava sobretudo a educação: “A governadora Yeda Crusius foi eleita convencendo a maioria da população gaúcha de que seria capaz de colocar em prática um novo jeito de governar. Muitos criaram a expectativa de que isto seria possível, no entanto, depois de pouco mais de cem dias de governo, o que se percebe é que a nova forma de governo é a aplicação do velho modelo neoliberal que prega um Estado mínimo e promove a destruição dos serviços básicos para a população.” Nesse novo jeito de governar, veio um novo jeito de educar que nos lega uma escola pública sem pessoal para a limpeza, para a biblioteca, para o laboratório de informática e para os setores pedagógicos, e empilha alunos em sala de aula.
Se a comunidade escolar (professores, pais e alunos) e a sociedade civil como um todo querem uma educação de qualidade no RS, que se mobilizem; já se querem uma educação destruída, sem qualidade, que cruzem os braços. No nosso Estado, tem-se realizado um processo de sucateamento da educação pelo Governo do Estado, o que não cessará e nem se reverterá sem a mobilização efetiva da sociedade, exigindo um outro modelo de administração da educação pelo Governo Estadual. Caso contrário, sem mobilização, a situação tende a piorar.
Rafael Hofmeister de Aguiar
Professor no Instituto Estadual de Educação Olívia Lahm Hirt (Igrejinha-RS)

Será que viramos credores?

Tem sido divulgada amplamente, a partir do Banco Central, a idéia de que, por obra e graça de uma política econômica competente e responsável, o Brasil se transformou de país devedor em país credor, a dívida externa acabou e não estamos mais vulneráveis ao intermitente mau humor do Tio Sam.
A mídia faz coro com esta interpretação edulcorada e muitos dos seus articulistas aproveitam a deixa para desqualificar toda e qualquer atitude rebelde contra a banca e o capital financeiro internacional e caracterizar como tresloucada a conduta dos governos da Venezuela, Equador e Bolívia, assim como da Argentina durante o calote muito bem aplicado por Nestor Kirchner.
Propaganda enganosa
Será mesmo verdade que de repente a nação superou sua histórica dependência econômica, passando de devedora a credora? A famosa vulnerabilidade externa já pode ser considerada coisa do passado? Se assim é, ou seja, se de fato viramos credores estamos provavelmente às portas do 1º Mundo, a caminho de deixar na poeira da história a condição de país periférico, dependente, para nos transformar numa potência capitalista, o que na olvidada concepção leninista é o status daquelas nações que aprendemos a classificar como imperialistas (1).
Pode até ser que o Brasil esteja a caminho de se transformar na grande potência imaginada pelos generais alguns anos atrás, mas pode ser também (e me parece bem mais provável) que estamos apenas diante de uma leitura superficial e ideológica das contas externas, sintonizada com o espírito e os interesses da mídia, uma leitura feita na medida certa para justificar o conservadorismo da política macroeconômica vigente. Em outros termos, trata-se de propaganda enganosa.
Conta falsa
Não terá sido à toa que o presidente do Banco Central, Henrique Meireles, tratou logo de atribuir a nossa nova condição (de credor) à “implementação de políticas macroeconômicas responsáveis e consistentes, baseadas no tripé responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e meta para a inflação” (leia-se juros altos). O argumento que comprovaria a façanha é de fácil assimilação pelo senso comum.
O valor das reservas brasileiras (divisas em moeda forte e ouro em poder do país) superou o montante da dívida externa pública e privada (2). Teoricamente, isto significa que o Brasil tem mais crédito do que débitos no exterior, o que automaticamente nos transformaria em credores.
A conta é simples, porém falsa. O artigo do economista Lecio Morais publicado neste mesmo diário sugere que uma análise um pouco mais atenta das estatísticas sobre o setor externo divulgadas pelo próprio Banco Central em janeiro não recomenda a euforia generalizada que se observa em relação ao tema. (3)
Passivo não é dívida?
Em primeiro lugar, cabe notar (como fez Morais) que o passivo externo do Brasil vem crescendo de forma preocupante ao longo dos últimos anos, em vez de diminuir. Atingiu o valor (bruto) de 785,9 bilhões de dólares em junho de 2007. Descontando os ativos externos do país - que também aumentaram bastante, passando de US$ 107 bilhões em 2001 para US$ 313 bilhões no ano passado (incluindo as reservas, que no final de fevereiro estavam estimadas em US$ 191 bilhões) -, o resultado é um passivo externo líquido de US$ 472 bilhões. Não é um valor desprezível e não devemos considerá-lo como uma mera e incômoda abstração matemática.
O passivo externo deve ser entendido como um conceito mais amplo da dívida de um país. É preciso entender que, em sua outra ponta, ele significa o estoque geral de ativos nacionais em posse de estrangeiros. Estes não se restringem à dívida externa em sentido restrito. Constituem-se, em larga medida, da exportação de capitais em diferentes modalidades, incluindo os investimentos diretos realizados pelas transnacionais, aplicações em títulos de renda fixa, aquisição de ações de empresas brasileiras, além dos empréstimos bancários.

Remuneração do capital
A relação entre passivo e ativo externo, que no nosso caso resulta no já referido passivo externo líquido de US$ 472 bilhões, reflete a interligação da economia brasileira com o capital financeiro internacional, de forma mais ampla e mais relevante que os títulos da dívida externa.
Qualquer que seja a modalidade do investimento em que está expresso, o ativo do capital financeiro internacional normalmente tem como contrapartida uma determinada remuneração, que no caso de investimentos capitalistas sempre significou lucro.
Formas da mais-valia
Do ponto de vista dos efeitos sobre a conta corrente, não faz muita diferença que a exportação de capitais assuma uma ou outra forma. Sob este aspecto, a única distinção relevante entre um empréstimo e um investimento direto ou em ações é que no primeiro caso a contrapartida (a remuneração do capital, seu lucro) é contabilizada como remessa de juros, enquanto no segundo é computada como saída de lucros e dividendos.
Lembremos aqui uma lição importante do filósofo alemão Karl Marx: lucros, juros e dividendos configuram denominações distintas para o excedente econômico extraído do processo de produção através da exploração da classe operária. São três modalidades da renda apropriada pelos capitalistas, cujo conteúdo básico é rigorosamente o mesmo: a velha e suada mais-valia (ou trabalho excedente) extraída da classe trabalhadora.
Espoliação invisível
Não se pode negar que a participação relativa dos títulos da dívida externa no passivo brasileiro declinou durante os últimos anos, de modo que a dívida já não tem, hoje, o mesmo impacto de antigamente sobre o balanço de pagamentos. As estatísticas não deixam margens a dúvidas quanto a isto.
Todavia, enquanto o peso dos débitos com os bancos caía, outras formas de exportação de capitais estrangeiros elevaram de maneira extraordinária o seu valor absoluto e relativo dentro do passivo, conforme revelam as estatísticas do Banco Central citadas no artigo de Lecio Morais. Ao contrário do que se verificava nos anos 80 e 90 do século passado, o estoque de investimentos diretos, impulsionados pela privatização na era FHC e posteriormente atraídos pelo crescimento, já supera em muito o valor da dívida, tendo alcançado US$ 287 bilhões em junho do ano passado. Os investimentos em ações somaram 260,8 bilhões na mesma ocasião.
O resultado disto é que em 2007 o pagamento líquido de juros, em todas as modalidades, recuou para US$ 7,1 bilhões, caindo 37% em relação a 2006, o que se explica pelo aumento das receitas com juros, de US$ 5,1 bilhões, em 2006, para US$10 bilhões no ano passado, decorrente basicamente das aplicações de reservas controlados pelo nosso Banco Central (nosso não, hoje é do Meireles e Cia.) em títulos do governo dos EUA.
Exploração capitalista
Diferentemente, as remessas totais de lucros e dividendos somaram US$ 21,2 bilhões em 2007, com crescimento de 29,9% na comparação com 2006. Já as remessas líquidas de royalties e licenças alcançaram US$ 1,9 bilhão (4). Devemos concluir daí, se adotarmos um ponto de vista marxista, que o valor da mais-valia brasileira apropriada pelo capital financeiro internacional nas diversas formas (juros, lucros, dividendos, royalties e licenças) e transferida ao exterior em 2007 totalizou mais de 30 bilhões de dólares.
Há mais de uma maneira de enxergar o fenômeno. O pensamento dominante (ainda mais agora que nossas incipientes multinacionais estão experimentando o gostinho viciado da acumulação e expansão no exterior) considera o lucro dos estrangeiros uma retribuição natural e justa do investimento capitalista que aqui eles realizaram.
Visão classista
O ponto de vista da classe trabalhadora, expresso naquilo que antigamente se chamava teoria do proletariado, não pode ser o mesmo. O conteúdo das remessas do capital financeiro é o fruto do suor mal pago do povo brasileiro, é trabalho excedente alienado ou mais-valia. Traduz uma exploração de classes, com a qual o operário consciente não deve se resignar, embora as relações de exploração tenham sido “naturalizadas” pelo pensamento liberal.
A realidade é que, além dos interesses da classe trabalhadora, os interesses nacionais em matéria de desenvolvimento também são afetadas de forma negativa pela exploração do capital financeiro internacional. Nota-se uma identidade entre os interesses do povo trabalhador e os interesses maiores da nação neste caso, o que não se observa em relação aos capitalistas.

Sangria da poupança nacional
O impacto dos lucros repatriados sobre a taxa de investimentos e o crescimento do PIB é negligenciado ou solenemente ignorado pela maioria dos analisas. Todavia, aqui convém lembrar uma lição que aprendi com o economista e professor Carlos Lessa, de que a poupança no capitalismo é formada basicamente pelos lucros gerados no processo produtivo (que, no caso em tela, se subdivide em lucros das multinacionais, juros bancários, dividendos, aluguéis, royalties, licenças etc.). O senso comum imagina que a poupança é dada pela economia feita com sacrifício por indivíduos ou famílias trabalhadoras (em boa medida depositada em cadernetas de poupança), mas isto significa pouco ou quase nada em vista da poupança que serve de base à acumulação e ao investimento (expansão) capitalistas.
O lucro que sai para remunerar as matrizes do capital estrangeiro é poupança nacional subtraída aos investimentos internos. Configuram, na verdade, uma espoliação imperialista tornada invisível pela cumplicidade do pensamento dominante e da mídia. Quando são positivos (como agora) os fluxos de investimentos estrangeiros obscurecem e em certa medida neutralizam os efeitos negativos das remessas sobre a taxa de investimentos, o que não altera a essência do problema.
Tributo imperialista
Os 30 bilhões de lucros, em diferentes modalidades, podem ser considerados uma espécie de tributo que o Brasil paga pela forma (subordinada) de inserção ao processo de reprodução e expansão do capital financeiro internacional, que confere ao sistema capitalista nacional, quando analisado sob uma ótica leninista, um caráter dependente, subalterno no interior da ordem econômica imperialista. Isto não muda da noite para o dia.
Embora os da direita digam que não, a dívida externa foi o garrote imperialista que provocou a crise do desenvolvimento nacional a partir dos anos 80 do século passado. As coisas mudaram e hoje já não se pode falar o mesmo. Contudo, o passivo externo líquido revitaliza a vulnerabilidade externa. A escalada das remessas de lucros e dividendos deveria ser considerada como um ultraje, não fosse à força do pensamento dominante e o escasso conhecimento do assunto nos meios políticos.
Déficit na conta corrente
Como conseqüência desta escalada, associada ao aumento das importações impulsionado pelo crescimento e o câmbio flutuante, as contas correntes estão de novo no vermelho. Em janeiro deste ano, o saldo negativo foi de 4,23 bilhões de dólares. Remessas de lucros e dividendos somaram três bilhões de dólares, enquanto o superávit comercial caiu para US$ 944 milhões.
Déficits em conta corrente não devem ser negligenciados. Em médio e longo prazo, eles podem se revelar um sério problema mesmo para potências capitalistas como os Estados Unidos. A decadência relativa da indústria e a decomposição da hegemonia do dólar são o preço do desleixo com o rombo na conta corrente do império, que se verifica desde 1982.
Todo saldo negativo nesta conta do balanço de pagamentos se desdobra em crescimento do passivo líquido e maior necessidade de financiamento externo. Quanto se torna recorrente, é prenúncio de problemas futuros no balanço de pagamentos, se o desequilíbrio não for corrigido a tempo. Apesar dos investimentos estrangeiros, que no momento estão em alta e cobrem o déficit em conta corrente (inclusive o de janeiro), o Brasil não está isento de riscos.
Taxar as remessas
No passado a consciência nacional sobre remessas de lucros era mais clara e desenvolvida. Uma das justificativas para o golpe de 1964, que como todos devem saber contou com o apoio ostensivo do imperialismo, foi à restrição das remessas de lucros imposta pelo governo Goulart em nome dos interesses nacionais, contra a vontade das multinacionais e seus aliados internos, através da Lei 4131, de 1962.
O liberalismo, exacerbado na gestão de Meirelles à frente do Banco Central, não é bom conselheiro no tratamento desta questão. No entanto, é ele que prevalece, como a referendar uma das razões do golpe aplicado pelos generais. Diga-se a favor dos militares que eles não foram tão liberais quanto se é hoje.
Não somos a China, que não precisa se preocupar com passivo externo e mantém um relacionamento soberano com as potências imperialistas e o capital financeiro internacional, ainda não se dá ao luxo do câmbio flutuante (apesar de ser a segunda potência econômica do mundo, atrás apenas dos EUA), e nunca foi liberal com a circulação de capitais. O mínimo que deve ser feito por aqui é tributar, fortemente, a remessa de lucros e dividendos, destinando os recursos arrecadados ao aumento dos investimentos públicos, conforme propõe a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, a CTB.
Unidade de contrários
Festeja-se muito, e de modo unilateral, o ingresso de capitais estrangeiros no país, sobretudo na forma de investimentos diretos (que não migram com muita facilidade), sem atinar para suas conseqüências em médio e longo prazo. Em curto prazo este movimento de capitais parece positivo. É o que está determinando o aumento das reservas, visto que o superávit comercial em queda tem sido consumido com as receitas obtidas pelos investidores estrangeiros (lucros remetidos ao exterior). Os investimentos externos, em associação com a queda do dólar, são o fator que torna mais remota a possibilidade de uma crise cambial no Brasil.
Mas, a dialética nos ensina que os fenômenos, sejam eles naturais ou sociais, costumam constituir uma unidade de contrários. É preciso aprender a enxergar a contradição que carregam. O outro lado da moeda na entrada de capitais estrangeiros é precisamente o seu resultado, a porta de saída, a crescente transferência ao exterior de riquezas produzidas pela força de trabalho nacional. Enquanto o fluxo de capitais for positivo (ou seja, enquanto estiver entrando mais capitais do que saindo) o problema passará despercebido, será mascarado, obscurecido.
Contexto internacional
Em médio prazo, a percepção pode mudar. O Brasil tem sido beneficiado pela queda do dólar e a ascensão vertiginosa da China, provavelmente os dois aspectos mais relevantes do desenvolvimento desigual das nações na atualidade. O fortalecimento do real e a mudança das relações de troca internacionais, com o aumento do preço relativo das commodities, têm contribuído significativamente para o revigoramento do mercado interno, a estabilidade monetária, a redução do valor real da dívida externa, o crescimento da renda, o superávit no balanço de pagamentos.
O contexto internacional está mudando. Vivemos um momento de transição. Os EUA enfrentam sérias dificuldades e, não obstante, a economia nacional não está às portas de uma crise cambial, como em 1998 e 2002. Apesar disto, convém ser prudente e tomar certos cuidados. É até provável que Deus seja brasileiro, conforme sugere o nosso sábio presidente, mas o Brasil ainda continua um país capitalista, e dependente. Os caminhos da reprodução capitalista são contraditórios.
Fluxos e refluxos
A experiência histórica indica que os fluxos positivos de capitais do centro para a periferia do sistema imperialista não são eternos e transcorrem segundo um movimento cíclico contraditório, alternando fases de expansão com contração do crédito e dos investimentos em geral.
Sabe-se que o Plano Real foi viabilizado por uma conjuntura internacional favorável, caracterizada pelo que os economistas chamam de grande liquidez ou disponibilidade de poupança para investimentos no mundo. O erro foi considerar que a bonança era eterna. A chamada crise asiática e a moratória russa agitaram os mercados internacionais e provocaram uma forte reversão do fluxo de capitais, levando à rápida erosão das reservas brasileiras em 1988 e à dramática mudança da política cambial em 1999.
O balanço de pagamentos voltaria a uma situação crítica e constrangedora em 2002, depois de uma redução substancial dos investimentos diretos externos em todo o mundo e do colapso da Nova Economia nos EUA. O Brasil quebrou, mais uma vez, e FHC achou por bem recorrer aos préstimos do FMI, que como sempre vierem condicionados a medidas amargas e antagônicas à necessidade de desenvolvimento nacional.
Interesses nacionais
Se a história tem algo a nos ensinar neste sentido é que a representação falsa da realidade na época do real forte, em que as reservas também cresciam junto com o passivo externo, justificou a política liberal que orienta nosso relacionamento com o capital financeiro internacional, mas não serviu nem serve aos interesses nacionais. Quando a fonte de financiamento externo voltar a secar ou escassear será indispensável usar as reservas para cobrir o déficit em conta corrente, que reflete a remuneração do passivo externo. As reservas não serão exigidas apenas nem principalmente para pagamento da dívida externa de médio e longo prazo, mas por todas as outras formas de lucros remetidos ao exterior e ao mais do que provável repatriamento de capitais.
O ritmo e a profundidade da redução das reservas dependerão da maior ou menor volatilidade do capital, que está associado à modalidade do ativo apropriado por estrangeiros. A capacidade de migração dos investimentos em ações e renda fixa é evidentemente muito maior do que a dos investimentos diretos ou em títulos da dívida externa.
Não somos credores
É conveniente reiterar que os riscos de uma crise cambial em curto prazo são reduzidos, apesar da crise financeira irradiada dos EUA. O valor das reservas acumuladas até o momento faz a diferença em relação a outras ocasiões da nossa história. Contudo, se a preocupação com a economia nacional se projetar para o médio ou longo prazo já não podemos dizer o mesmo.
Quem exibe um passivo externo de quase meio trilhão de dólares não deve cantar de galo, nem pode se considerar um credor. Em que pese uma situação do balanço de pagamentos em curto prazo bem mais confortável do que em passado recente (o país não parece a caminho de uma crise cambial como em 1998 e em 2002), a posição do Brasil no interior da ordem imperialista internacional não é tão boa quanto se quer fazer crer. “Somos um país liquidamente devedor, o que não é nenhuma novidade”, conclui Lecio Morais.
Esta é uma premissa que devemos ter a prudência de considerar ao examinar o problema, a menos que se queira trocar a realidade pela ideologia (da direita). Em nome dos interesses nacionais, se quisermos evitar surpresas desagradáveis no futuro, é preciso exigir a mudança da política em relação ao capital financeiro internacional, com o estabelecimento de controle sobre os investimentos estrangeiros e o câmbio, bem como a tributação e outras formas de restrição às remessas.
Notas:

1- É certo que, com o tempo, os países imperialistas, por força do vício do parasitismo, acabam contraindo débitos no exterior e se transformando em devedores líquidos (como é o caso, hoje, dos EUA), mas isto já é outra história.

2- No dia 20 de fevereiro de 2008 “as reservas atingiram o recorde de US$ 188,2 bilhões que, somados a outros créditos e disponibilidades no exterior, superam em mais de US$ 4 bilhões, a dívida externa total de US$ 197,7 bilhões”, conforme informou o jornal “O Estado de São Paulo”, em editorial intitulado “De devedor a credor” (23-2, página A3). No final do mesmo mês, o valor das reservas era estimado em 191 bilhões de dólares (1).

3- O artigo, intitulado “Vulnerabilidade e investimento estrangeiro sentados na bolha”, foi publicado no “Diário Vermelho” dia 22-2

4- Um resultado líquido dos juros (entrada e saída) negativo, em 7 bilhões de dólares, nos coloca na estranha e inusitada situação de um país “credor” que paga juros, o que em parte pode ser explicado pelo fato de que a remuneração dos títulos do Tesouro dos EUA, onde foi investido o grosso das reservas brasileiras (em torno de 4% ao ano), é bem inferior aos encargos da dívida contraída com a banca internacional



*Umberto Martins, Jornalista, membro da Secretaria Sindical Nacional do PCdoB.

AS RELAÇÕES DE TRABALHO E A CONVENÇÃO 151 DA OIT

O tema “servidor público” é pouco debatido em termos de estudos acadêmicos, sendo a sua literatura escassa e, raros são os trabalhos publicados sobre o tema tratando-o de uma maneira abrangente. Já a doutrina brasileira insere o tema, principalmente, no âmbito do direito administrativo, do direito constitucional e previdenciário perpassando, em determinados momentos, por outras disciplinas jurídicas. As maiores produções foram organizadas por estudiosos de linha conservadora, na sua ampla maioria, administradores/gestores, sem uma vivência cotidiana de servidor público voltado para a prestação de serviço público de qualidade à sociedade Brasileira.

Por Fátima dos Reis*
Infelizmente, a verdade é que os doutrinadores e os próprios servidores públicos, ainda não despertaram para a realidade do serviço público, em todas as esferas de governo e de poder, da importância das relações de trabalho estabelecidas entre a administração pública e os seus servidores, que assegure o respeito às leis e aos direitos dos cidadãos e garanta as conquistas dos trabalhadores, bem como do papel fundamental que desempenham no processo de desenvolvimento do país, com crescimento sustentado, através de políticas públicas, executadas por trabalhadores públicos capacitados e que se sintam co-participes do todo o processo, indo desde a elaboração, passando pela sua execução, chegando até a sua avaliação.

As relações de trabalho entre os servidores públicos e o Estado sempre se deu de forma unilateral, podendo ser modificadas a qualquer momento e sem prévio aviso, de acordo com os interesses da administração pública, conforme atestou o administrativista Hely Lopes Meirelles.

“...no interesse do serviço público,..., ainda que em seu prejuízo pessoal; os seus direitos podem ser restringidos e as suas obrigações ampliadas, sem necessidade de sua aquiescência e sem que possa, opor-se às modificações unilateral da administração”. (Meirelles, 1976, p.374).

A Constituição de 1988 procurou o estabelecer o equilíbrio entre o Poder Público e seu quadro de pessoal, não resguardo apenas os interesses dos servidores públicos, mas assegurando ao Estado os meios para administrar com legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade, eficiência, razoabilidade e proporcionalidade conforme artigo 37 da CF/88.

A nova Constituição ampliou diversos direitos aos servidores públicos e, embora tenha havido avanços importantes como a irredutibilidade de remuneração e o reconhecimento do direito de organização e de greve, o servidor público ainda é tratado como “peça da engrenagem estatal”, sem direto a negociação coletiva, e como tal, está sujeito “à vontade dos governantes/gestor”. Prova disso são as Emendas Constitucionais (EC) 19, 20 e 41 que suprimiu as conquistas da Constituição em 88, unilateralmente.

Já no final da década de 80, Fernando Collor e a imprensa, proporcionou um dos maiores ataques ao servidor público insuflando a população contra os servidores públicos realizando a “caça aos marajás”, estigma que perdura até os dias de hoje.

Neste período se deu o maior número de aposentadorias precoce da história, sendo agravada pelas reformas realizadas pelo Governo de Fernando Henrique Cardoso. Durante estes governos o neoliberalismo se manifestou na sua forma mais cruel.

Atualmente, apesar de termos um presidente cuja origem é a classe trabalhadora, o governo federal tem decidido, de forma unilateral, principalmente, quando, em seu primeiro governo, realizou a malfada reforma da previdência em 2003 eliminando, assim, mais uma conquista da CF de 88.

Exemplo mais recente da unilateralidade do governo no que se refere ao servidor público é o caso da CPMF, quando o Ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, em reunião com mais de 20 entidades sindicais de servidores, propôs a repactuação dos prazos dos acordos já firmados com algumas categorias em vista da perda de R$ 40 bilhões no Orçamento de 2008 depois da rejeição pelo Congresso da CPMF. Se tivéssemos o direito a negociação coletiva, fatos como este jamais aconteceria. Atitudes como esta acontece nas três esferas de governo e de poder e se dá pelo fato da não regulamentação do direito de greve e do direito a negociação no serviço público.

A convenção e a Constituição Brasileira

Neste contexto, um tanto quanto contraditório, o Governo acena com um importante avanço no estabelecimento de novas e democráticas relações de trabalho com seus servidores, ao enviar para o Congresso Nacional a proposta de ratificação da Convenção 151-OIT que tem como propósito estabelecer uma nova relação de trabalho entre o servidor público e o Estado, instaurando processos que permitam a negociação das condições de trabalho entre as autoridades públicas interessadas e as organizações de trabalhadores da função pública.

A Convenção 151 da Organização Internacional do Trabalho data de 1978, tendo entrado em vigor no plano internacional em 25 de fevereiro de 1981. No seu artigo 1º, afirma que ela deverá ser aplicada a todas as pessoas empregadas pela administração pública, na medida em que não lhes forem aplicáveis disposições mais favoráveis de outras convenções. Trata da proteção ao direito de sindicalização, das facilidades que devem ser concedidas às organizações de empregados públicos, incentivando a solução negociada dos conflitos surgidos no exercício das relações de trabalho.

Com ratificada a Convenção 151, será possível ao governo negociar com os sindicatos a regulamentação de relação de trabalho de cada uma das categorias do funcionalismo. A questão da greve faria parte desta contratação coletiva.

Limitadores constitucionais

A Constituição Federal Brasileira de 1988, em seu artigo 9º assegura o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender. O inciso VI, do artigo 37 da Constituição Federal, garantiu ao servidor público civil o direito à livre associação sindical. Já no inciso VII do artigo 37, ficou assegurado o direito de greve do servidor civil, nos limites definidos em lei.

Embora a CF garanta ao servidor público o direito de sindicalização e decidir sobre a realização de greve, o servidor público não tem assegurado na Constituição o processo de negociação coletiva, onde são colocadas numa mesa as suas reivindicações. Por decisão do STF, através da ADI 492-DF o servidor público civil não pode negociar por meio de uma convenção coletiva e, não sendo possível a realização de acordo, todo processo de discussão entre o governo e seus servidores deverá ser transformado em projeto de lei, para ser aprovado pelo Congresso Nacional. Hoje, apenas 9 (nove) categorias tem firmado com o governo um termo de acordo negociado, em processo de greve, em 2007.

Apesar de todas as contradições e impedimentos presentes na Constituição de 88, só foi possível inserir os chamados pequenos avanços, em função da mobilização dos servidores públicos que nunca deixaram de realizar suas reivindicações, através de greve, desde a década de 80, período mais duro do regime militar, pois, somente com ela seus pleitos são resolvidos. Mesmo num período democrático, as greves dos servidores têm acontecido com freqüência, enquanto instrumento legitimo de pressão, e somente com elas, as suas reivindicações têm sido atendidas.

Fica a pergunta, será que as condições legais e objetivas para se implantar esta convenção no Brasil serão criadas? Criar estas condições é o desafio de todos!

Este é um debate deve abranger o conjunto dos servidores públicos através de todas as centrais sindicais e entidades de servidores públicos, com a abertura de audiências públicas para que possamos ter assegurada a participação de todos, não podendo ficar apenas no âmbito de uma central sindical.

* Fátima dos Reis é assistente social, coordenadora de Educação da Fasubra sindical, Coordenadora do Sint-UFG

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

CTB E A REFORMA TRIBUTÁRIA: IMPRESSÕES PRELIMINARES

CTB CONSIDERA TÍMIDA A REFORMA TRIBUTÁRIA PROPOSTA PELO GOVERNO
O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadores do Brasil (CTB), Wagner Gomes, declarou nesta segunda-feira, em Brasília, que a reforma tributária proposta pelo governo Lula “é tímida, não corresponde aos interesses da classe trabalhadora e tem aspectos preocupantes”.A preocupação do sindicalista, que ontem participou de uma reunião com o presidente Lula e o ministro da Fazenda, Guido Mantega, sobre o tema, é com a desoneração da folha de pagamentos através do fim do salário-educação e a redução da contribuição patronal para o INSS – de 20% para 14%.A arrecadação do salário-educação representou algo em torno de 7 bilhões de reais em 2007. “Não está claro como esses recursos que são destinados à educação serão compensados. Nós não podemos aceitar o fim puro e simples do salário-educação”, ponderou Gomes. O mesmo raciocínio se aplica à redução da contribuição das empresas para a Previdência. “Já dizem que a Previdência é deficitária com as receitas que recolhe atualmente. Com a diminuição da contribuição patronal. a pressão para uma mudança das regras contra os trabalhadores e trabalhadoras, que já é grande, tende a aumentar. Queremos o fim do fator previdenciário e o fortalecimento da Previdência Pública, nunca o enfraquecimento. Por isto, estamos seriamente preocupados”, assinalou o presidente da CTB.Wagner Gomes lembrou, ainda, que as centrais lançaram recentemente uma nota conjunta em defesa de uma reforma tributária socialmente justa, fundada no princípio da progressividade. Entre outras coisas, o movimento sindical pleiteia a regulamentação do imposto sobre grandes fortunas, previsto na Constituição, a elevação dos tributos sobre herança, a taxação dos lucros auferidos com a especulação financeira e das remessas de lucros e dividendos, além da isenção de impostos sobre a cesta básica.Nada disto foi contemplado na proposta do governo, uma iniciativa que a CTB considera tímida, além de preocupante. “Conclamamos as centrais e o conjunto do movimento sindical a unificar suas forças e intensificar a luta por uma reforma tributária progressiva e socialmente justa, nos termos do documento aprovado e divulgado em janeiro”, finalizou Wagner Gomes.

DEBATE ABERTO

http://www.agenciacartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=3830
DEBATE ABERTO
Lula: a história e seus credores
Quando era presidente, Fernando Henrique Cardoso se propôs a superar a "era Vargas". Ou seja, fazer do Estado um apêndice do mercado. O que o sociólogo da banca não poderia supor é que oito anos depois, o desafio fosse outro: como suplantar a "era Lula" e restabelecer a velha política de terra arrasada que marcou o seu mandato?
Gilson Caroni Filho
O anúncio do Banco Central de que, pela primeira vez em sua história, o país se tornou credor externo vai muito além da dimensão simbólica. É a evidência de uma política macroeconômica que, responsável e consistente, consegue superar a vulnerabilidade deixada por um padrão acumulativo assentado no endividamento externo.Não estamos deixando para trás uma crise apenas cíclica, de conjuntura, mas essencialmente estrutural cuja saída ainda exige um conjunto de medidas de profundidade, tendo em vista a mudança no caráter do desenvolvimento. O que estamos ultrapassando vem do modelo desenvolvimentista de JK, atravessa os 20 anos de oligarquia empresarial-militar iniciada em 1964 e se agrava com o modelo neoliberal implantado nos anos 1990 do século passado.O soerguimento se dá em meio a uma reestruturação mundial do capitalismo, marcada pelo envelhecimento de padrões tecnológicos e de produção. No ocaso da divisão prevalecente dos mercados e, mais importante de tudo, do crepúsculo da ordenação comercial amparada na hegemonia do dólar, a economia brasileira mostra sua vitalidade. A lenta e dolorosa agonia do que está inexoravelmente condenado a desaparecer é o sol da nossa emergência.Retomar o crescimento direcionado para o resgate da enorme dívida social, com as contas externas saneadas, cala de vez os que falavam em continuidade do receituário do governo anterior, tanto quanto sinaliza o perigo de um eventual retorno dos que ainda pregam um Estado enfraquecido, mínimo. Daqueles que, como bem destacou Emir Sader ("É o Estado, estúpido!"), advogam menos "Estado, em ultima instância, porque o Estado organiza os cidadãos, que são sujeitos de direitos. Menos Estado e mais mercado, que organiza consumidores, medidos não por direitos – que não são reconhecidos pelo mercado -, mas pela capacidade de consumo".Sempre é bom recordar que, há pouco menos de uma década, a dívida externa do setor público somava R$ 103 bilhões, descontadas as reservas em dólar. Os títulos federais corrigidos pelo câmbio saltaram de R$ 68 bilhões, em setembro de 1998, para R$105 bilhões em dezembro de 1999. A ausência de políticas para o produtor nacional produziu as mais baixas médias de tarifa de importação.Na época, o ex-presidente do BC, Gustavo Franco, não cansava de repetir que o governo FHC não tinha uma política comercial do produtor, mas do consumidor. Para que incentivos à produção se ela era orientada pela demanda do consumo? O fundamentalismo do mercado falava grosso. A supervalorização cambial, de uma só tragada, levou os US$40 bilhões obtidos com a privatização do patrimônio público.Em debate no auditório da Folha de S. Paulo,às vésperas das eleições de 2002, Luis Carlos Mendonça, ex-ministro das Comunicações resumiu com franqueza incomum o que foi a gestão competente do tucanato:"a utilização do câmbio deixou de ser componente do plano de estabilização e passou a ser instrumento ideológico". O baixo nível das reservas e a péssima capacidade da rolagem da dívida levou o bloco de poder anterior a bater às portas do FMI.Em sua intervenção, Paulo Rabello de Castro repudiou o fato de "o Brasil ter extrema necessidade de ser aceito lá fora. Esse aplauso externo nos custa muito caro". Castro disse que o país dos primeiros seis meses do próximo governo deveria montar uma "defesa financeira", que incluiria dois "nãos" e um "sim": Não quero endividamento, não quero FMI e quero reservas de US$ 70 bilhões".Para o economista, com bom trânsito junto ao antigo PFL, o governo Lula deve ter saído melhor que a encomenda. Não só veio a dupla negativa como as reservas somam hoje US$188,5 bilhões. Quando era presidente, Fernando Henrique Cardoso se propôs a superar a "era Vargas". Ou seja, fazer do Estado um apêndice do mercado. O que o sociólogo da banca não poderia supor é que oito anos depois, o desafio fosse outro: como suplantar a "era Lula" e restabelecer a velha política de terra arrasada que marcou o seu mandato? Pelo andar da carruagem, até José Serra está sendo reavaliado pelos roteiristas das redações. É feia a crise na locomotiva do atraso.
Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, e colaborador do Jornal do Brasil e Observatório da Imprensa.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

A redução da jornada na ordem do dia


A classe trabalhadora e o movimento sindical brasileiro acabam de ganhar um aliado de peso na luta pela redução da jornada sem redução de salários, bandeira que encerra um significado histórico e tem caráter estratégico para a maioria da sociedade. Em reunião com os presidentes das centrais sindicais dia 14-2, no Palácio do Planalto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva declarou sua solidariedade à campanha nacional unificada pela aprovação da Proposta de Emenda Constitucional – PEC 393/01, de autoria dos senadores Inácio Arruda (PCdoB-CE) e Paulo Paim (PT-RS), que reduz o tempo de trabalho de 44 para 40 horas semanais, num primeiro momento, e para 35 horas posteriormente.
O apoio do presidente - que tem origem na classe operária e se projetou politicamente nas greves que a partir do ABC paulista selaram o fim do regime militar e a redemocratização do país - tende a dar novo fôlego ao movimento, que três dias antes (11-2) reuniu os dirigentes das centrais na Praça Ramos, em São Paulo, para o lançamento do abaixo-assinado que será encaminhado ao Congresso Nacional pleiteando caráter de urgência para a tramitação da PEC 393. O objetivo é coletar mais de um milhão de assinaturas até o 1º de Maio, que neste ano terá na redução da jornada a sua principal bandeira.
Necessidade históricaSabe-se que o avanço da ciência, as revoluções tecnológicas e a imposição de novos métodos de organização do processo de trabalho impulsionam o crescimento da produtividade da economia, que por sua vez se traduz na redução do tempo social de trabalho necessário à produção das mercadorias destinadas a satisfazer as demandas da sociedade humana. Ou seja, se a produtividade cresceu isto significa que as empresas estão produzindo mais do que antes a cada hora ou ao término de cada jornada de trabalho. A conseqüência lógica de tal processo deveria ser a redução da jornada média que cada trabalhador ou trabalhadora deve realizar por força do contrato, formal ou informal, firmado com o empregador.
A duração do tempo de trabalho não ficou inalterada ao longo da história do capitalismo. As estatísticas indicam que a jornada média sofreu uma sensível diminuição. A classe trabalhadora brasileira, por exemplo, ingressou no século XX labutando 16 horas diárias de domingo a domingo, sem direito a descanso semanal remunerado e a troco de salários miseráveis. Desde então, a jornada máxima caiu à metade e está estabelecida, na Constituição e na CLT, em 8 horas diárias, embora em muitos casos o expediente das horas extras esteja transformando a lei em letra morta. Categorias como comerciários, entre outras, trabalham em média bem mais do que as 44 horas semanais estabelecidas na Constituição, que há 20 anos (em 1988) reduziu a jornada em 4 horas semanais. Em certo sentido podemos afirmar que a redução da jornada é uma necessidade histórica criada pelo próprio progresso das forças produtivas. Todavia, cometeremos um grave erro político se daí extrairmos a conclusão de que o próprio desenvolvimento da economia conduzirá espontaneamente a este resultado. Toda experiência histórica revela que a redução da jornada só se transforma em realidade através de uma luta enérgica da classe trabalhadora. Isto ocorre porque o capitalismo - que se alimenta não do trabalho necessário para a reprodução da vida social, mas daquilo que Karl Marx chamou de trabalho excedente ou mais valia - é radicalmente contra a redução da jornada, a menos que esta seja acompanhada de uma diminuição proporcional dos salários, o que é inaceitável para a classe trabalhadora.
Luta de classes O confronto de interesses entre capital e trabalho neste terreno transparece nas posições das entidades que representam os dois lados. As centrais sindicais e o conjunto do movimento representativo da classe trabalhadora, incluindo os partidos de esquerda, estão unidos na luta pela redução da jornada. De outro lado, entidades representativas do patronato (como a Confederação Nacional da Indústria – CNI - e a Federação da Indústria de São Paulo –FIESP -, entre outras) são frontalmente contra tal idéia e chegam a propor, pelo contrário, o aumento do tempo de trabalho.
O neoliberalismo radicalizou as posições patronais e, em alguns países, chegou a reverter a tendência histórica favorável à redução da jornada. Na Alemanha, representantes do capital querem a ampliação da jornada legal de 35 para 50 horas semanais, o que tem gerado forte indignação e resistência dos sindicatos. Nicolas Sarkozi, líder da direita francesa, foi eleito presidente com o lema reacionário “trabalhar mais para ganhar mais”.
Na América Latina, felizmente, a realidade é outra. A derrota dos partidos neoliberais e ascensão de novas forças sociais aos governos mudaram o cenário político, de modo que a bandeira da redução da jornada voltou à ordem do dia em muitos países.
A CTB na Campanha
No Brasil, como na Venezuela, esta aspiração histórica da classe trabalhadora, que originou o 1º de Maio, ganhou força com as vitórias de Lula e Chávez. A possibilidade de redução da jornada tem sido aberta pelo progresso da produtividade, que por aqui foi notável ao longo dos últimos 20 anos da chamada Constituição Cidadã. Conforme disse o presidente Lula, “os avanços da modernidade, as conquistas tecnológicas devem significar não apenas um maior aumento de produtividade e rentabilidade, mas também servir para aumentar as horas de lazer do trabalhador e melhorar as condições de trabalho”. Contudo, a transformação desta possibilidade em realidade não se dará sem a enérgica intervenção do movimento sindical para quebrar a intransigência patronal.
A questão interessa ao conjunto da sociedade. A experiência ensina que sem a redução da jornada, os ganhos de produtividade, apropriados exclusivamente pelo capital, geram mais desemprego, mais violência, mais insegurança social. Uma jornada de 40 horas semanais, como propõe a PEC 393 num primeiro momento, deve abrir mais de 2 milhões de novos postos de trabalho no mercado formal, segundo estimativas do Dieese, se for acompanhada de uma regulação mais rigorosa e restritiva das horas extras.
Trata-se de uma medida que vai fortalecer o mercado interno, ao ampliar o emprego e a massa salarial, e tende a favorecer o crescimento da produtividade e a maior qualificação profissional, já que propiciará ao trabalhador mais tempo livre para a educação. É uma bandeira integrada à luta por um novo projeto de desenvolvimento nacional, com soberania e valorização do trabalho. Por essas e outras boas razões, a CTB participa com entusiasmo da campanha unitária das centrais e orienta toda a militância e lideranças nas bases, neste momento, a concentrar esforços na coleta de assinaturas. O apoio do presidente Lula veio em boa hora. Vamos à luta!

Por Wagner Gomes, presidente da CTB